sábado, 26 de setembro de 2015

Análise - Metal Gear Solid V: The Phantom Pain



No mundo do Cinema é perfeitamente comum associarmos um nome particular de um diretor a quaisquer de suas obras. Scorsese, Kubrick, Fincher, Nolan... é imensa a lista de criadores que tem seus filmes sempre associados a seus nomes.
Na indústria dos games, raramente isso acontece, sendo que na maioria das vezes um game tem sua produção diretamente ligada ao estúdio responsável pela obra como um geral. No entanto, se existe um diretor que excede tal regra, esse diretor é Hideo Kojima.

Responsável pela criação de uma das mais importantes e aclamadas séries da história dos videogames há 28 anos com Metal Gear (MSX, 1987), Kojima se sedimentou como uma das grandes figuras da indústria em 1998 com a obra-prima do primeiro Playstation, Metal Gear Solid.



Depois de quase três décadas e oito títulos dirigidos, Hideo Kojima tem em Metal Gear Solid V: The Phantom Pain aquele que é provavelmente o seu último trabalho com sua criação. Dada a recente quebra na parceria entre o diretor e a produtora da série, Konami (e o provável afastamento desta da produção de jogos grandes), ao que tudo indica, MGS V se trata, de fato, do último título da homônima série de espionagem.

Nesta carta de despedida, Metal Gear Solid V não só recebe o primeiro tratamento da série em um espaço de mundo-aberto, como também é o jogo que promete ligar as sagas de Solid Snake (iniciada no primeiro Metal Gear) com a saga de Big Boss (iniciada em Metal Gear Solid 3: Snake Eater).

HISTÓRIA

Nove anos depois dos eventos ocorridos em Ground Zeroes (a destruição da Mother Base), Snake (Kiefer Sutherland) acorda do coma no qual a devastação o colocou, quando um grupo militar (e outras estranhas figuras) atacam o hospital no qual o protagonista se encontra no objetivo de matá-lo.

Depois de um interessante (e psicodélico) prólogo, Snake se reencontra com o infame Ocelot (Troy Baker) e seu antigo parceiro Kaz Miller (Robin Atkin Downes) e, em conjunto, os três homens decidem arquitetar um plano de vingança contra o homem responsável pela tragédia há nove anos e, no processo, reconstruir Mother Base (inicialmente estabelecida por Big Boss e Miller em Peace Walker), formando um grupo militar independente denominado Diamond Dogs.



Metal Gear é uma série conhecida por sempre apresentar grandiosas, complexas e densas tramas, algo que, por mais que sempre tenha sido um dos grandes “chamarizes” da série, também muitas vezes foi seu maior problema.

Não que não seja uma série que mantenha uma até eficiente coesão narrativa ao longo de seus vinte oito anos de existência (por que até mantem), mas muitas vezes as tramas dos jogos se mostraram excessivamente convolutas a ponto de até mesmo os mais antigos fãs se sentirem perdidos.

The Phantom Pain, porém, conta aquela que é a história mais “isolada” que a série já apresentou. Pelo menos no espectro geral da trama, já que permite novos jogadores a pelo menos se identificarem com a linha de “vingança” que norteia a narrativa.



Dito isso, nos momentos mais climáticos da história, o roteiro de Kojima deixa de lado a “solidariedade” aos novatos e volta a remeter aos jogos anteriores da série, fazendo referências à eventos e personagens, que caso você não tenha jogado ao menos Snake Eater e Peace Walker (as duas histórias que precedem The Phantom Pain) se sentirá completamente perdido frente ao que é discutido na tela. Para os fãs fiéis a série (como eu) isso é uma excelente notícia, uma vez que um dos grandes temores pré-lançamento, era que Metal Gear Solid V diminuísse sua preocupação com seu universo em prol de atrair novos jogadores. Assim, se você não é familiar com a história da série, as chances são de que você não terá a mínima ideia da gravidade ou da importância de alguns dos eventos que acontecem ao longo da jornada de Big Boss.

Assim sendo, é preciso apontar que The Phantom Pain apresenta uma linha narrativa surpreendentemente esparsa para os parâmetros de Metal Gear.



Se nos jogos anteriores cutscenes tomavam grande parte do tempo da história, em The Phantom Pain estas são uma exceção para a progressão narrativa. É quase como se o jogo fosse uma antítese à Metal Gear Solid 4: Guns of the Patriots que chegava a contar com cutscenes que facilmente ultrapassavam uma hora de duração.

Como alguém que acompanha a série há mais de uma década, isso não deixa de ser um pouco decepcionante – afinal de contas, o jogo deixa de apresentar aquela que é uma das maiores veias de Metal Gear.

Se os jogos anteriores exibiam uma estrutura cinematográfica na apresentação da história (fruto da paixão de Kojima pelo Cinema), The Phantom Pain possui uma formatação semelhante a uma série de TV, com a trama dividida em episódios, com direito ao surgimento de créditos ao início e fim de cada um destes.



A trama acaba aparentando esparsa devido ao fato de que na grande maioria destes episódios acompanhamos Big Boss em missões menores, que em pequeníssimas doses avançam a história central do jogo envolvendo a vingança do protagonista. Fora isso, essa estrutura acaba às vezes machucando gravemente o ritmo da história (especialmente próximo ao final do jogo quando você é obrigado a repetir missões previamente completadas para desbloquear novos episódios). Vale notar que tal problema infelizmente ainda acaba comprometendo um pouco o momentum da história ao rumo do último episódio, que surge de forma abrupta, lamentavelmente detraindo um pouco da conclusão do jogo.

Na tentativa de preencher este “vácuo” narrativo ao longo do jogo você vai adquirindo fitas de áudio que esclarecem algumas questões não discutidas nas cutscenes tradicionais. Não é a melhor forma de descobrirmos sobre mais da história, mas algumas vezes tais fitas até conseguem complementar satisfatoriamente algumas questões.



É preciso apontar também que Metal Gear Solid V apresenta uma história que é descaradamente incompleta, com pontas narrativas claramente deixadas soltas sem a menor das explicações. O jogo na verdade contava com um capítulo final que amarraria várias destas pontas, mas que foi cortado do game(sem dúvidas devido aos conflitos com a Konami, que provavelmente não aceitou continuar injetando dinheiro no projeto e obrigou Kojima a encerrar a produção mais cedo). A sensação final para alguém que acompanha a série fielmente não deixa de ser um pouco decepcionante.

Dito isto, não é como se The Phantom Pain fosse isento de “momentos Metal Gear”.



Metal Gear Solid V conta com um competente elenco de personagens para guiar aquela que é a trama mais coerente em tom já apresentada em qualquer jogo da série.

Pautado em uma história inicialmente embasada em vingança pessoal, The Phantom Pain deixa de lado na maior parte do tempo o (fraco) humor ocasional da série em virtude de uma narrativa que trata de temas pesados de forma notavelmente eficaz, como questões existenciais fascinantes e as vezes até mesmo sociais (como a militarização infantil).

Ao longo da jornada também somos apresentados a uma faceta nova de personagens já previamente conhecidos.



Kiefer Sutherland encarna Big Boss como a versão mais silenciosa que já vimos do personagem, substituindo (o insubstituível) David Hayter de maneira surpreendentemente excelente, dando até um peso a mais de humanidade ao protagonista. Ao seu lado, Robin Atkin Downes, interpretando Miller, mais uma vez entrega um dos personagens mais chatos da série, ao passo que Troy Baker concebe aquele que é mais carismático Ocelot até hoje (ainda que valha notar que nenhum dos dois sejam minimamente desenvolvidos ao longo da história).



Complementando o elenco com uma face nova, a bela Stefanie Joosten compõe com necessária sutileza a fascinante Quiet, que apresenta aquele que é, sem dúvidas, o arco narrativo mais bem resolvido de The Phantom Pain. É uma pena, no entanto que a personagem seja vítima do lamentável costume de Kojima de super-sexualizar suas personagens femininas, com o roteiro ainda tentando apresentar uma patética explicação para a forma reveladora como a personagem se veste.

Ainda que apresente uma linha narrativa esporádica e uma resolução incompleta, The Phantom Pain é sem dúvidas uma das melhores histórias que Kojima já contou, e em “típica maneira Metal Gear”, conta também com uma das maiores e mais fascinantes reviravoltas na história da série.

JOGABILIDADE


Metal Gear sempre foi uma série que atraiu os jogadores pela história, que sempre foi o destaque das obras de Kojima.

Em The Phantom Pain, este não é o caso para adentrar a experiência.

Em Metal Gear Solid V, pela primeira vez na história da série, quem toma os holofotes não é a narrativa, mas sim a jogabilidade.

The Phantom Pain é um dos jogos mais divertidos que já tive o prazer de jogar. Poucas vezes me vi tão fascinado com a afinidade mecânica de um jogo em conjunto com seus sistemas e componentes.



MGS V é uma obra-prima inegável no campo do design de games. É a culminação de toda a experiência de Hideo Kojima no tempo em que habita esta indústria.

Adotando pela primeira vez na série a estrutura de um jogo de mundo-aberto, The Phantom Pain é uma obra que mergulha o jogador em alguns dos espaços mais bem desenvolvidos em jogos do gênero para o desenvolvimento de missões.

Com diversas ferramentas ao dispor de Snake, o jogo entrega ao jogador apenas as peças para este criar suas próprias táticas de infiltrações em bases/postes inimigos extraordinariamente bem concebidos. Tais locações possibilitam sempre uma aproximação a 360º, no processo estimulando o jogador a elaborar estratégias para a aproximação que mais lhe convir, seja no silêncio total, ou “ a lá Rambo”, destruindo tudo e todos ao seu redor, ou mesmo em qualquer nível entre os dois extremos.






Fora a infinidade de equipamentos disponíveis para Snake, o protagonista ainda conta com companheiros para suas missões, cada um com suas próprias habilidades específicas: D-Horse permite a travessia ágil pelo mundo-aberto do jogo, D-Dog marca os inimigos a medida que você infiltra uma base inimiga, atacando também ao comando de Big Boss, D-Walker, um robô caminhante, permite uma aproximação ofensiva mais direta, e a sniper Quiet pode fazer o reconhecimento avançado da posição de inimigos, atacando também sob o comando do jogador quando preciso.

Cada um destes companheiros também conta com uma extensiva progressão de habilidades, fazendo com que a companhia de cada um diferencie notavelmente a aproximação que o jogador deve tomar em uma missão.



Fora o funcionamento mecânico excepcional do jogo, The Phantom Pain volta a apresentar o sistema de manutenção da Mother Base introduzido em Peace Walker. Porém, aqui, diferentemente de Peace Walker, que muitas vezes frustrava e impedia o avanço do jogo, o sistema funciona extraordinariamente bem, se tornando extremamente estimulante a medida que o jogador avança no jogo, sempre impulsionando o desbloqueio de novas armas, diversos upgrades e equipamentos novos. Isso tudo contribui para o estabelecimento de um ciclo de jogo absurdamente viciante, fazendo com que você se empenhe efetivamente em recrutar mais soldados e expandir sua Mother Base.

Toda esta excelência de mecânicas e design é amparada por controles absolutamente responsivos e intuitivos, e movimentar Big Boss pelos cenários nunca foi tão gratificante.



Ainda que o deserto Afeganistão e a selva africana não sejam os espaços de mundo-aberto mais exploráveis já feitos, no sentido de “até onde você vê, você pode ir”, ambos os mapas também fazem excelente uso da disposição de locações para missões. E por mais que as estruturas destas não variem muito (a maioria consiste na eliminação de algum alvo ou algo do tipo), as aproximações e formas de se jogar são tantas, que é como se sempre há algo diferente a tentar (e o jogo faz um trabalho extraordinário em encorajar a criatividade).

Contando com horas e horas de jogo (há tempos não despejava tantas horas em um game com tanta facilidade), The Phantom Pain é o exemplo perfeito de jogabilidade emergente. Com suas centenas de missões (50 principais e 157 paralelas), é normal ultrapassar a casa das cem horas de jogo e ainda se ver descobrindo novas maneiras de se brincar com seus sistemas.

The Phantom Pain é um jogo tão divertido de se jogar que é impossível não recomendar para qualquer jogador. Mesmo quem não esteja familiar com a trama da série, a jogabilidade afinadíssima do game já vale a experiência.

Metal Gear Solid V é o ápice dos jogos de stealth, o que é apropriadamente sintomático considerando que é a culminação do talento de Kojima que há 28 anos se estabeleceu pioneiro do gênero no primeiro jogo da série.

Melhor que isto não fica.

APRESENTAÇÃO


Os jogos de Kojima sempre se mostraram visualmente impressionantes para suas respectivas épocas de lançamento. Em Metal Gear Solid V, a história não é diferente.
Ainda que seja limitado por suas versões para a última geração de consoles, no panorama geral, The Phantom Pain é um jogo tecnicamente impressionante.

Rodando a suavíssimos 60 quadros por segundo no Playstation 4, Xbox One e PC, a sensação de fluxo responsivo da jogabilidade fica ainda mais evidente.



Os modelos dos personagens também são surpreendentemente impressionantes, desde cicatrizes até detalhes pequenos na barba de alguém demostram primazia técnica da equipe de artistas e programadores da Kojima Productions. A captura dos movimentos faciais dos atores também contribui notavelmente para a humanização dos personagens, muitas vezes passando mais emoção às performances graças à tecnologia detalhista.

Como já era de se esperar de uma obra de Kojima, as cutscenes do jogo se mostram estupendas em qualidade. O diretor talentosamente atribui peso emocional as cenas simplesmente devido a sua concepção de planos particulares (se mostrando um dos poucos diretores de fotografia destacáveis na indústria), e é fascinante como atribui a própria câmera um status de “personagem”, com esta mergulhando metodicamente pelos ambientes enquanto acompanhamos a ação sob uma visão particularmente intimista.



A trilha-sonora de The Phantom Pain é algo merece a máxima das atenções. Não só contando com mais uma impecável e primorosa trilha original composta por Harry Gregson-Williams e Ludvig Forssell (que compõem temas inesquecíveis como “Quiet´s Theme” e “Sins of the Father”), o jogo ainda acerta ao máximo ao incluir canções licenciadas, com destaque para o maravilhoso uso narrativo de “The Man Who Sold the World”. Por se passar na década de 80, Kojima ainda tira proveito para incluir clássicos como “Take on Me” e “Kids in America” que transmitem de forma fenomenal a vibe da época no qual o jogo se passa.

CONCLUSÃO

Metal Gear Solid V: The Phantom Pain é um jogo extraordinário.

Apresentando uma trama madura (ainda que incompleta), que mergulha em temas profundos e envolventes de forma coesa, The Phantom Pain é uma das obras de Kojima mais marcantes no espectro narrativo e temático que trata.

É lamentável que a história concebida por Kojima não tenha visto a luz do dia da forma como era originalmente pretendida. A sensação é mais amarga ainda quando percebemos que este é realmente, ao que tudo indica, o ultimo Metal Gear, e assim, dificilmente veremos algumas das pontas aqui deixadas soltas serem amarradas um dia.



Apesar deste vazio que fica no coração dos fãs da série, Kojima compensa com o melhor jogo de stealth já concebido até hoje (e como um admirador incondicional do gênero, considere esta uma afirmativa e tanto).

Com uma jogabilidade afinada ao máximo, MGS V é recomendação certa até mesmo se fosse não acompanha a série, simplesmente por que é impossível não apreciar tamanha excelência aqui apresentada.

Metal Gear Solid V: The Phantom Pain é fruto do refinamento de três décadas das ideias de uma das maiores mentes da história dos videogames.

Kojima, we salute you.




Confira a versão em vídeo de nossa análise abaixo:




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2 comentários:

  1. Sem Spoilers mas gostaria de saber se no final ele vira vilão pra se encaixar com o Metal Gear 1 fechando o buraco que tem no meio da série.

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    1. Primeiramente obrigado pelo comentário :) E é difícil responder sua pergunta sem spoiler, mas fique seguro, o final encaixa no primeiro Metal Gear do MSX sim. De uma forma completamente inesperada, mas q eu achei particularmente genial. O jogo deixa pontas soltas com relação a outras situações, mas com relação a fechar esse ciclo, ele faz excelentemente.

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A Game Center Brasil agradece seu comentário.