quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Análise - Resident Evil 2



A ideia de uma remake é frequentemente mal vista dentro do mundo da Sétima Arte. E não é por nada. A prospectiva de recontar a história de clássicos como O Poderoso Chefão ou Taxi Driver é não só fútil (afinal, ambos são obras-primas atemporais), como também arriscada (o peso histórico do material fonte é gigantesco).

Claro, não é certo generalizar que remakes no Cinema são sempre exercícios infrutíferos e, ocasionalmente, projetos acertam ao adotar uma perspectiva nova para o material (como o recente Suspiria, nova versão do clássico italiano de terror, de 1977). Infelizmente, porém, atualmente, a maioria de projetos do tipo está relegada a uma atualização tecnológica do material fonte, em pouco acrescentando a sua inspiração original.

No mundo dos videogames, no entanto, a ideia de um remake é naturalmente mais atrativa. Por se tratar de uma mídia que depende intrinsicamente da base tecnológica na qual é produzida, os games são frequentemente um reflexo do status quo de sua tecnologia contemporânea, naturalmente exibindo tantos os avanços como as limitações de tal. Dessa maneira, a ideia de reintroduzir uma obra com todos os seus componentes técnicos atualizados pode ser extremamente tentadora para certos tipos de projetos, em especial aqueles que são claramente beneficiados pelos avanços gráficos para a retratação de seus mundos.

E é justamente nesta categoria que Resident Evil 2 se encaixa.

Reimaginação do clássico de 1998 e sequência daquele que é considerado como “o grande pai” dos survival horrors, Resident Evil 2 toma como base os personagens e linha narrativa principal do jogo original e os estrutura sob uma roupagem completamente nova.

Deixando de lado a perspectiva de câmeras fixas dos jogos iniciais da franquia em favor da visão de “over the shoulder” popularizada a partir do quarto jogo da série, RE2 tem início quando o policial novato Leon Kennedy (Nick Apostolides) e a estudante Claire Redfield (Stephanie Panisello) cruzam seus caminhos durante um incidente a caminho de Raccoon City. Não demora muito para a dupla perceber que um surto que transforma as pessoas em zumbis tomou conta da cidade, relegando aos dois descobrir o que aconteceu ali e escapar com os sobreviventes que encontram ao longo do caminho.

Dispondo de duas campanhas distintas – uma para Claire e outra para Chris – RE2 permite que o jogador opte por qual personagem escolher para a “1ª Jornada” do jogo, naturalmente fazendo a 2ª jornada com o outro personagem.

Sendo bastante semelhantes na estrutura e nos lugares que visitamos em cada uma, as jornadas se diferem na ordem de descoberta dos elementos/lugares e na exploração de alguns ambientes particulares. Fora isso, em cada uma, Chris e Claire se deparam e se envolvem com personagens distintos e relevantes para a própria trama, dando um “sabor diferente” a cada uma.

Eficaz ao nortear o rumo da trama e engajar o jogador a cumprir a missão, a empreitada narrativa de Resident Evil 2 não é das mais impressionantes no resto. Apresentando um charme do ‘tosco’ característico de histórias de ação e terror da década de 90, mas fazendo pouco mais para nos investir naquele universo, o roteiro do game é particularmente frágil no que toca ao estabelecimento de seus personagens principais para além de seus traços superficiais e na interação entre estes. Assim, se Claire é uma garota relativamente carismática devido a performance de Stephanie Panisello, o roteiro faz pouco para retratá-la além do arquétipo de uma “Mary Sue”, enquanto Leon não só permanece como um indivíduo sem personalidade, como também demonstra um nível de ingenuidade e desligamento dos seus arredores que chega a ser risível. Para piorar, a tentativa da história de criar algum laço do jogador para com a relação dos protagonistas é hilária (no mal sentido), colocando os personagens para expressarem brados de companheirismo meros minutos depois de se conhecerem sem qualquer resquício de ressonância dramática.

Apesar de tudo isso, o charme inerente na direção da história e no abraço a sua natureza tosca nos impedem de levar a trama muito a sério, nos relegando então a apreciar a maior das virtudes de Resident Evil 2: o exercício do survival horror.




Eficiente ao estabelecer um ritmo de tensão constante, em RE2, o conforto com relação à sobrevivência parece estar sempre a um passo de desmoronar. Assim, se você tem suprimentos para se manter “curado”, as chances são de que você se encontra carente de munição. Da mesma forma, a partir do primeiro momento no qual o jogador começa a manter ciência do layout da delegacia na qual boa parte do jogo se passa, RE2 vai e introduz o infame Mr. X (ou Tirano) – um monstro aterrador que roda aquele ambiente inteiro, sempre atrás dos passos de Claire e Leon, impossibilitando qualquer sensação de segurança naquele lugar. Mantendo este ritmo de incessante tensão, combinado com uma progressiva sensação de poder de fogo na reta final das campanhas, Resident Evil 2 se encerra em um ponto que o início imediato de uma nova Jornada com outro personagem é intuitivo – afinal, o conhecimento acerca da estrutura dos ambientes do jogo adiciona uma perspectiva empoderadora e revigorante, ainda que jamais livre da aflição da primeira corrida.

Impecável na criação de seus ambientes (a delegacia, a cidade, a seção subterrânea e o laboratório do terceiro ato são todos assustadoramente detalhados e exalam histórias e personalidades próprias) e excepcional na jogabilidade momento-a-momento (explodir cabeças de zumbis talvez nunca foi tão prazeroso), RE2 acaba se estabelecendo como um exemplar inquestionavelmente admirável para a série, seguindo alguns templates característicos da franquia, mas os quais são realizados de forma tão competente, que é impossível julgar a obra por “falta de inovação”.

Na verdade, se Resident Evil 7 e este novo Resident Evil 2 são indicativos do rumo do survival horror dentro da série, a franquia de terror da Capcom não poderia estar mais bem encaminhada.


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