Por: Luigi Wagner
Em um mundo onde a competição pela atenção constante
dos jogadores parece ser um dos apelos centrais das produtoras e publishers nos videogames, os jogos caracterizados
como live-services possuem, em sua
essência de design, ciclos que visam estar sempre disponibilizando novidades
(ainda que ínfimas) para seus adeptos.
Neste âmbito, os tais dos looter-shooters (jogos de tiro com recompensas baseadas em loot) se tornaram algumas das obras mais
proeminentes, com exemplares grandes em jogos como Destiny e The Division.
Frequentemente problemáticos em seus lançamentos,
tais jogos sempre encontraram dificuldade, particularmente, no esclarecimento e
na disponibilização de um fluxo claro de conteúdo principal e de “pós-jogo” (o
famigerado endgame).
Considerando que estes tropeços quase que se
tornaram uma regra no lançamento de jogos do gênero, é um tanto revigorante
perceber que The Division 2,
sequência do jogo inspirado pelo universo de Tom Clancy, de 2016, é uma obra
que acerta logo de cara tanto na estruturação de sua campanha principal, como
de seu endgame.
Tendo agora como pano de fundo a extensa Washington
D.C. (depois da excelente recriação de Manhattan no primeiro jogo), The Division 2 situa o jogador mais uma
vez no papel de um Agente do governo que – no velho estilo Tom Clancy – é responsável
pela “imposição da ordem” após o surto epidêmico que atingiu várias partes do
mundo alguns meses antes.
Possuindo em seu exercício
narrativo o único ponto de maior fraqueza quando comparado ao jogo anterior, The Division 2 faz pouquíssimo para
manter o jogador investido em sua história principal, dispondo de várias
figuras militares aleatórias que parecem estar ali apenas para nos dar ordens e
direcionar para missões. E se na abordagem de sua trama principal o primeiro
jogo era também notavelmente fraco, pelo menos em sua construção narrativa
através de áudios e gravações encontradas pelo mundo, o game acertava ao pintar
o retrato do caos dos sobreviventes nos períodos logo seguintes ao “apocalipse”.
O mesmo infelizmente não pode ser dito sobre The Division 2, que ao focar 95% das gravações e áudios em
integrantes das facções inimigas que encontramos pelo mundo, faz pouco para
diferenciar estas entre si, ao mesmo tempo que não estimula interesse na
decadência daquela parte do mundo em particular.
Acaba que os esforços
narrativos da sequência que de fato funcionam são aqueles embasados pelas próprias
e impecavelmente construídas ambientações que encapsulam a Washington D.C. do
jogo, que se mostram surpreendentemente diversas em estilo e estrutura.
Eficaz ao estimular a
exploração dos vários cantos da capital estadunidense já por esta versatilidade
de personalidades em cada ambiente (que vão desde museus que contam trechos da
Guerra do Vietnã a planetários e o congresso norte-americano), The Division 2 eleva esta ‘curiosidade’
ao máximo devido a constante recompensa por se explorar, já que o fazer
frequentemente resulta na descoberta de armas, equipamentos, materiais e
utensílios sempre úteis para as batalhas, como granadas e armaduras.
Esta disposição inteligente
de componentes, por sinal, é um dos principais motivos pelos quais The Division 2 é tão eficaz na
transmissão de sensação de progresso. Assim, se a descoberta de armas e equipamentos
é naturalmente estimulante pela subida de níveis destes, a descoberta de
materiais (e a ‘destruição’ de loot em
excesso para obtenção destes) é também recompensadora a médio e longo prazo,
uma vez que tais materiais podem ser doados para acampamentos que acabam por
disponibilizar não só novos recursos para o jogador, como também equipamentos
antes inatingíveis (como anexos/attachments
para armas). Estendendo esta sensação de progresso para o próprio endgame do jogo (que chega a adicionar
uma nova e ameaçadora facção de inimigos), The
Division 2 é capaz de arrancar horas e horas do jogador comum, mantendo o
fluxo de progresso do início ao ‘fim’ com uma naturalidade invejável.
Por fim, é justo afirmar que
esta sensação de progresso seria de pouca relevância caso o game não fosse
divertido de se jogar momento-a-momento. Felizmente, apesar de contar com pouca
variedade na estruturação das missões (todas, sem exceção, envolvem tiroteios),
The Division 2 é particularmente
primoroso em suas mecânicas de tiro. O simples ato de atirar na sequência, por
exemplo, é infinitamente mais prazeroso do que no jogo anterior, visto que a
ação é embasada pelo fantástico design de som das armas, além do jogo contar
com inimigos bem menos “esponjosos” e que em suas animações de “recebimento de
tiros” reagem de forma muito mais orgânica aos disparos do jogador. Junta-se
também o fato de que o game conta com uma variedade surpreendente de tipos de
inimigos que, quando combinados, de fato requerem estratégias para
enfrentamento de acordo com cada locação (e o game merece aplausos pelo design
de levels de cada missão), e The Division
2, em termos puramente mecânicos, se valida como um jogo extremamente
divertido de se engajar momento-a-momento (seja sozinho ou com amigos).
Com alguns lapsos técnicos
ocasionalmente chamativos (pop-ins são
particularmente frequentes), no escopo geral, The Division 2 acaba se estabelecendo como uma empreitada
extremamente acertada por parte da Ubisoft, obtendo sucesso na maior parte de
suas decisões de design e, acima de tudo, mostrando á indústria que o
lançamento de “jogos como serviço” não necessariamente precisa estar atrelado à
problemas e frustrações que só serão consertados meses depois.
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